começos: 1, 2, 3 e já...


from: Roberta Ferraz
to: Re Huber, Erica
date: Fri, Oct 9, 2009 at 12:32 PM
subject: aéreo porto




vamos começar a satisfação dos nossos desejos - ?




pergunto ......... pergunta


hoje eu quero pouco, um pedaço do dia relatado, talvez


porque não estaremos juntas






sonhei mal, um avião caía na Índia


13 pessoas morriam, apenas e era quase




agora, estar a ouvir coltrane babalú ou o que lhe baste


e cantante alegre na toada das estradas de praia


e de repente buuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuum


ou então amarrada dentro de um pássaro de metal


narcotrancafiada num objeto reto voador


e de repente craaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaash


isso não






e toda a noite a labuta de engendrar e mercerer


a boa morte, enquanto o bafo do sonho me coloca


diante de uma violenta margem a dizer


adeus sem boca, muda, mulher proibida de falar


(isso: não dizer, não dizer a morte equivalendo


o não morrer? - eu morro pela palavra - é isso?


o corpo que me cabe precisa findar pela palavra -


é isso a oração)






porque morrer sem o deixar-se o largar-se


é ficar ainda, mas já sem corpo, no trauma


de ser não ser


é como viver vários dias que se vive só no esperar


a morte


não é? aí equivalentes, a morte veloz e a vida plácida.


duas coisas que embotam medo


que embotam buracos


nos relógios








ahhhhhh erica renata amadas


cansei por ora


vim aqui falar de desejos e só consegui dizer o pesadelo


e toda a metafísica mais íntima






é verdade é desejo é o mais recôndido


desta que vos falam






vou ter de voar


e voltar para as Índias - circunavegação pelos ares


pelos pêlos da família


lá conviver de frente ao mar


sal nos olhos e peito embutido?






medo de voar












bom feriado


pra vcs duas


e vão de estrela


por favor


ao lado da


aeronave


hj às 19hs


por favor


me dêem as


mãos


















beijos


r.




from: Renata Huber
to: Roberta Ferraz, Erica
date: Fri, Oct 9, 2009 at 7:36 PM
subject: Re: aéreo porto




as ferroadas do fogo zumbindo seu enxame de estrelas....


começo....rasgando os véus do grito


estrangeirando meus passos


no escuro que se cumpre


entre a pedra e a corda bamba






minhas feridas agora


elocubrando bicicletas


aéreas acrobacias


nos fios de nylon de uma infância






há um tecido em tudo isso


eu fiz dos cacos um tecido


e escoleótica


tombei


serpenteando meus festins


com a queridinha das torturas






essa pele que roçamos


digo


esse desejo pergaminho


que nos conflui e orienta


vos deseja e vos consagra






entre o nada e o abismo


entre nós e vós


um palhaço alquimista


um equilibrista do pasmo


em guilhotinas cor-de-rosa






dança, dizem...


roça o ventre nessa farpa


e diz à eles a dor que dói






diz ana, sylvia


aushwitz


explode teu silêncio e dramatiza teu perfil






um abajur cirúrgico


por exemplo


o tétrico devir das vítimas


nas vitrines do poder






uma luz


fria


cortante uma quilha


e um choro antigo de mulher


ancorando num teatro






........................






acordes do avesso


era o nome


o crucifixo de madeira


a perna, de pau


os carrosséis da santidade


e as vertigens faraônicas


do meu ego impublicável






.....................................






dizer ou não dizer


as hemorróidas da morte


gozar ou não gozar


em seu manto de tricô


gritar ou calar


os ratos que me olham


pelas frestas do porão...






hoje tive um lapso...






hoje


sonhei com o doutor...






hoje


rasguei uma foto...






.................................






hoje viagem


banho de mar e muito jazz


para aguentar a tia avó






hoje amor, nabokov


ardor de vozes


desejos






desejos de encontro


de vasos comunicantes


do mais recôndito exílio


de liberdade






desejo de abraçar vocês


erica e roberta


de brindar e seguir brindando


o ser em nós, em vós


o ser...










ahhhhhh...






bom feriado minhas lindas


bons ventos....






beijo, beijo


e até









from: erica zingano
to: Renata Huber, Roberta Ferraz
date: Sat, Oct 10, 2009 at 9:20 AM
subject: Re: aéreo porto


queridas


tranças


de mulheres


a olhar o mar






estive e estou assim


perdida entre capas e capas


de livros espalhadas pelo chão








ontem fui comprar uma nova estante


para recolher tantas páginas preciosas


pedras entre os pés molhados


da água bêbada do tejo








fiz um promessa, depois dos 30 anos


não comprarei mais livros


(quer dizer, não comprarei mais livros assim)




http://www.flickr.com/photos/cadernodeviagens/3996097653/






escrevo com mais calma, depois


um poema de chegada










um beijo, e começamos


"ama como a estrada começa"
é o verso do cesariny na cabeça


ah! portugal portugal


ez




from: Roberta Ferraz
to: Erica, Re Huber

date: Tue, Oct 13, 2009 at 1:24 PM
subject: açudes


companheiras


divisoras do pão comigo






olhe, saí dos portos aéreos


para um açude bem suculento


negro subterrâneo






estou hoje paralisada


com a sensação de estar tudo errado


(sim, re, esses dias vêm a mim, com uma estranha frequencia até)


mas não vou choramingar lamentar me exilar me exaltar






estou triste






sem vontades de astrolgias, por um tempo


exangue


ocupada demais com os sonhos memorialísticos que ando tendo


ai, queria sair comprar estantes arrumar os livros da casa


talvez precise mesmo de vcs comigo, pra essa arrumação da casa


sabe?






re tua voz poética é FODA. tens imagens que me arrebatam!


em que recanto ficam esconsos todos esses tesouros?


que prece quebra o elo que os mantem atados ao escuro?


se for algo que se possa vir em voz, quero cantá-los.


quero ler alto com vocês ler mais alto ainda ouvir da boca


o nosso encontro






hj, triste


dor na garganta


me relembra o mário






estou estudando para a aula que vou dar 2af próxima


e coisas muito coisas belas do octavio paz vieram


coisas que quero repartir


e aquela sua via, eriqueta, na primeira linha do paz no livro


'f. pessoa, o desconhecido de si mesmo', quando ele diz:


'o poeta não tem biografia. sua obra é a sua biografia'.


é isso, não?






esse é um texto que gostaria de ler com vcs.












se eu não colo nos ditames surrealistas, gente, aí a coisa aperta mesmo.






só o erro liberta






então quiça uma filigrana de pena tenha brotado aqui no meu projeto de asa?






mas tudo muito cansativo, muito esforçado, muito mala pesada






a geografia da cidade, apesar, dá um alento, salva um pouquinho - fui no pão de açucar, subi bondinho - isso é quase erótico,


não fosse o sol 40 graus e a turistada fotográfica ao redor suando feliz






eu preciso encontrar vocês


preciso precioso






já proposta: esta 5af, às 18hs - início de nosso encontro amor-teatro amor-tecido? para o drama extático "O Marinheiro"?


tiro cópias largas para nós três.


vamos começar essa viagem? assim, no erro, sem saber onde nos levará?






até lá,


estudos portugueses


nostalgia


sonhos assustadores (onde os mortos ressuscitam)


(os mortos que eu preferiria mortos mesmo)






e uma tristeza de moletom, silêncio, e celular desligado










mas com amor


em vocês






bjs


rosa




from: erica zingano
to: Roberta Ferraz, Re Huber
date: Tue, Oct 13, 2009 at 9:20 PM
subject: Re: açudes




envolta em luz


laranja (a garganta


da fala


comer o mundo


dos vivos
e dos mortos


eu arrasto o pé


e não saio


perto
e longe
meu momento
é agora


entretecida


& rarefeita


de estados








ainda não cheguei


mas hoje


me proibi de ir


e disse não


ao meu pensamento


queria tomar outro avião


e voltar


"seu tempo é aqui"


repeti








expresso dois dois - dois dois


acho que era assim o nome da música


era boa conversa no balcão


do supermercado


a sra. profa de biologia


que vinha com essa estória de foto antiga


foto pra contar o passado


1939 era agora a mais antiga


lá no projeto da usp de genética


saí às gargalhadas com ela


tão às gargalhadas que esqueci


a cândida (água sanitária / lixívia /
quiboa, variações em português
para dizer - melhor - tornar branco)


no balcão do supermercado






não voltei atrás


estou no agora


no instante


no estalo








"foi por medo de avião"


(ele também escorpiano)


reinventou a morte


a sua própria sorte


jogo de sim e de não










sem escapatória










nosso teatro de sombras


e luz


eu vejo


e revejo


a imagem das três mulheres de costas


encostadas à amurada


cabelos crista crina


estamos lá










(cortei, de leve os meus hoje,


estou graciosa como uma menina,


"a menina é brasileira...)










quando começamos?


ah, nossa leitura dramática!








abraço em silêncio


estou tão perdida


e cansada


de dias e dias
de viagem
de volta








não consigo escrever


de tanto pra organizar


mas aparece aqui e ali


um pensamento solto


entre lampejos


de ainda lisboa


no meu coração


acelerado










aos poucos


me aproprio do tempo


dos por fazeres e adentro


bem devagar


em cada ciclo do instante








voltei a organizar o tempo


entre tantas ideias soltas


trazidas pela viagem


volto para não perder o hábito


da caneta sempre perto da mão


é uma carícia


a caneta










lá onde eu


sem saber


me lanço mais uma vez


ao desconhecido de mim


com vocês sempre perto


um alento


de perder o tempo


sem perder o chão










http://www.flickr.com/photos/cadernodeviagens/4009348805/












bez






from: erica zingano
to: Roberta Ferraz, Re Huber
date: Tue, Oct 13, 2009 at 9:26 PM
subject: Re: açudes






queridas


5ª é bem


desculpem a tontice


ando sonâmbula sonâmbula






aguardo confirmação,








ah, sra. ferraz, por favor


entendemos a necessidade de descanso e revisões astrológicas


mas precisamos dos seus serviços de atendimento


marcamos o mapa pra quando, vc diz, na sua agenda mágica










beijos


ez








from: Roberta Ferraz
to: Erica, Re Huber
date: Wed, Oct 14, 2009 at 9:46 AM
subject: RE: açudes






amadas amêndoas






ontem fiquei lendo carta do pessoa ao cortes-rodrigues, até bem dentro madrugada


amei e me irritei


porque sempre saio das correspondências com um sentido de "ah, entendi"


e ao final fica o macaquinho dos xistes pregando peças, não descansando, dizendo "ah, sua tonta!"






e aí o aí


essa coisa mesclada de coisas






mas a carta é muito bela e muito megalomaníaca


mas ele sabia disso, então está 'perdoado', rs...






amanhã, no MARANITO, amores?


eriqueta confirmada, eu confirmada, ............renatinhaaaaaaaaaa, aonde estás?






eriqueta, amanhã mesmo já marcamos em agendola mágica a data de seu mapa


para o seu, querida, não tenho sono, sou feliz nele!






bom, agora vou passar por aí: Maranus, Kalunga, Correio, sol.


ah, quero conversas: ontem descobri aí uma bolsa de creative writing da UNESCO, que pode ser experimentada na França ou na Índia!


estou querendo me inscrever, mas não sei se dá tempo, é só até 31 de outubro... tentarei,,,,,vcs não topam?


vamos às Índias, chicas? vamos ao tempero das canelas?






vou ler seu mail maior agora eriqueta






e até amanhã quinta quentinha






beijos










renataaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa, aparece














beijos




from: Renata Huber
to: Roberta Ferraz, Erica
date: Wed, Oct 14, 2009 at 2:44 PM
subject: Re: açudes







queridas minhas,






cheguei ontem da ilha bela e fui direto pro teatro


um curso de meia tijela


horrivelzinho de ruim mas nem tanto


pois a tia nos regalou o Cântico Negro do Régio


e foi aquele auê.


Saí de lá coçando


doida pra encenar o poema com vocês e bumba


quinta-feira marcado, confirmado


o marinheiro no maranus !






A gripe me pegou


uma mistura de gim


com ar condicionado


mas amanhã estarei bem


espero






lendo as mensagens de vocês


me ocorreu...






à beira do açude


uma garça


bashô


uma vontade alaranjada


e outras leituras


......................






a vida haikai


intensa


o instante do lapso


lázuli


a pedra lúbrica


de sol






e era uma vez um bichinho


digo


um ser meio asa


meio barbatana


um tipo inadaptado


que eu contei para as crianças


e chamei de "Algo"


o que na terra


definha






contar histórias


é maiêutico






descobri que as crianças


aquelas


são amigas dos piratas


e sonhei


um navio fantasma


com três mulheres à bordo






...............






Acabo de ler "Já estivemos em Lisboa sem jamais ter estado", um artigo do Enrique Vila-Matas, na revista Serrote


esse sonambulismo....aiaiai






sigo com vós


no mais fundo


e rizomático


de mim






quem sabe as índias


as áfricas


uma missão apocalíptica


no casaquistão


siiiimmm






beijo saudoso de amanhã







from: erica zingano
to: roberta ferraz, renata huber
date: Sun, Oct 18, 2009 at 8:29 PM
no subject




voltar o olhar para as nossas conversas


e sentir sempre


depois


pela distância talvez


um silêncio


percorrendo o interior das nossas falas










nesses textos, e-mails que ficaram


esperando resposta


é sempre a tentativa de se chegar


a algum lugar


nosso


onde nunca tocamos


e nem nos deixamos tocar










o desvio da fala


esse silêncio


criando novos caminhos


é talvez o texto que nunca escreveremos


juntos


porque não falamos


juntos


em outra língua


a distância é ainda maior


mais natural










me interrogo qual o sentido


de estar me envolvendo neste enlace


entre essas vozes


monopólio no meio de poetas


todas mulheres


de estirpes elevadas










- quem sois vós, bendito homem


entre nós?


é a pergunta que nunca te fiz


e acho que nunca farei






from: Roberta Ferraz
to: Erica, Re Huber
date: Mon, Oct 19, 2009 at 10:36 AM
subject: terror antigo




perco os escritos


e também me debruço sobre


esse inevitável mistério: quem sermos nós


nesse gesto de olhar para trás?


que tabu rompido talvez escape em nossos olhos?


por que, ó raios, este marinheiro extático,


esse drama grandioso de nossa imperfeição?


também me detenho me fluo me pergunto,


o que entre nós move a roldana da leitura


a roldana de linho e véu das mãos em escrita


das noites no maranus, janela aberta?


buscamos como orpheu, (onde o marinheiro


primeiro assumiu mar e correnteza)


um vislumbre de eurídice?


como arianas ariadnes aranhas


buscamos um (quem sabe) breve






descanso






para a alma?






é isso um olhar para trás


ir além da regra mágica que burla o corpo hesitante


o grande tabu primitivo que era romper a caminhada e










olhar para trás










é isso que fazemos, nós


clandestinas de uma outra cidade


de uma outra cicatriz?


juntas, entre sons e cheiros e LSD em palavras


rosas artificiosas como uma meditação


desse que tu sempre intercalas


-eriqueta- nas escaladas


do escrever


à mão






quem somos? o que?


que vento breve do poente


deitou em nossos dia de cidade


afungentada


e


agora


bela


arde?






tempos de pessoa


alheadas na floresta


irmanadas em noites bambas


gente dando a mão


em drama?


texto solto que nos ata


quem somos?






é tudo um grande mistério






i know not what tomorrow will bring






and yet










súbita mão de algum fantasma oculto


entre as dobras da noite e do meu sono


sacode-me e eu acordo, e no abandono


da noite não enxergo gesto ou vulto.






mas um terror antigo, que insepulto


trago no coração, como de um trono


desce e se afirma meu senhor e dono


sem ordem, sem meneio e sem insulto.






e eu sinto a minha vida de repente


presa por uma corda de Inconsciente


a qualquer mão nocturna que me guia.






sinto que sou ninguém salvo uma sombra


de um vulto que não vejo e que me assombra,


e em nada existo como a treva fria






(Pessoa, obras completas, p.57)














terror antigo incauto lastro


abre-nos a raia do negrume


e das vísceras enroladas no abdomen


cava um alo de um tempo outro


justo






justo à nossa temperada intempérie


ao fulgir massacrado das idéias


à parca contemplação do que nos fere


às mãos num gesto irresoluto






terror antigo veste-nos em nosso


corpo e luto, calha em nós a fome


densa de dar as mãos os tecidos


a face


ao rosto de uma à outra


aparição






evoé














from: Renata Huber
to: erica zingano,Roberta Ferraz
date: Mon, Oct 19, 2009 at 10:51 PM
no subject






entranhadas gaivotas


sopram tédio


eu me vejo


roçando o eco imperial


do alheio esquecimento


o extático estupor


das clepsidras que se vergam


bocejando o artifício


das orgias esfumadas






sonhos verde-anis


apenas


o sentir expectante


do sem sentido que me roça






agora, um barco


um marulho de lençóis


hasteados no longínquo


um sono de viver


debandando as ilusões


estilhaçando os ossos


contra as rochas encantadas






será este o sentido


me pergunto


enquanto a morte vai ao leme


imprevisível das fanfarras






a morte e suas falas


nostálgicas


irmanadas




from: erica zingano
to: roberta ferraz, renata huber
date: Tue, Oct 20, 2009 at 10:26 AM
subject: mistério latada


meninas, li esse poema por aí
(obs. o mistério da latada!)








BALOIÇO






O tempo no baloiço pendulava


e era infindo, dependente, meu.


Sob a latada o tempo eu conduzia,


ele voava segundo a segundo,


rebanho, sem poeira, desfilava.






Quase tocava nos cachos de uva.


Outro tempo infiltrava-se nos bagos,


chamava pardais, abelhas, cestos vindimos,


e embrandecia, adoçava a sua queda.










António Osório










e no poema da sophia a imagem de lata se repete,










Digo:


"Lisboa"


Quando atravesso - vinda do sul - o rio


E a cidade a que chego abre-se como se do seu nome nascesse


Abre-se e ergue-se em sua extensão nocturna


Em seu longo luzir de azul e rio


Em seu corpo amontoado de colinas -


Vejo-a melhor porque a digo


Tudo se mostra melhor porque digo


Tudo mostra melhor o seu estar e a sua carência


Porque digo


Lisboa com seu nome de ser e de não-ser


Com seus meandros de espanto insónia e lata


E seu secreto rebrilhar de coisa de teatro


Seu conivente sorrir de intriga e máscara


Enquanto o largo mar a Ocidente se dilata


Lisboa oscilando como uma grande barca


Lisboa cruelmente construída ao longo da sua própria ausência


Digo o nome da cidade


- Digo para ver










----------------------------------------------------------


Para além da incônscia beleza do poema (hehe)


na criação da cidade pelo dizer da palavra cidade


há o mistério da imagem de lata (hummm)


mais uma vez aqui, no vocabulário lusitano


a imagem se repete


graças a deus não como latada


ainda um mistério irresoluto para nós










será que essa imagem (nada bela)
não é um dos mistérios do quinto império português?










bez




from: erica zingano
to: Roberta Ferraz, Re Huber
date: Tue, Oct 20, 2009 at 7:35 PM
subject: Re: marinheiras, texto rilke paisagem




queridas


segue o texto rilke paisagem


bez


Sobre a Paisagem – Rainer Maria Rilke (trad. Do francês Beto Tibaji) 
      Sabe-se bem pouco sobre a pintura da antiguidade; mas não é tão arriscado supor que ela representava os homens assim como os pintores de uma época mais recente viram a paisagem. Nas imagens de vasos, naqueles testemunhos inesquecíveis de uma grande arte do desenho, o cenário (casa ou rua) é apenas citado, de certa maneira abreviado, designado por sua inicial ; mas os homens nus são aí absolutamente iguais às arvores que carregam frutos e guirlandas de frutos ou a arbustos que florescem e a primaveras nas quais cantam os pássaros. Naquele tempo, o corpo, que se cultivava assim como uma terra, sobre o qual se suava como para obter dele uma colheita, e que era possuído assim como se possui um bom terreno, era a única beleza que retinha o olhar, a imagem que todas as significações, deuses e animais e todos os sentidos da vida atravessavam alinhados ritmicamente. O homem, embora existisse há milênios, era ainda novo demais para si mesmo. A paisagem era: o caminho no qual ele andava, a pista na qual ele corria, eram todos aqueles estádios e praças de jogos ou de dança onde se realizava o dia grego; eram os vales onde se reuniam as forças armadas, os portos de onde se partia para a aventura e aonde se chegava, mais velho e cheio de lembranças inauditas; os dias de festa e as noites que, enfeitadas com um tilintar prateado, a eles sucediam, as ascensões rumo aos deuses e o movimento em torno do altar – esta era a paisagem na qual se vivia. Mas era desconhecida a montanha em que nenhum deus com rosto de homem morasse; desconhecido o promontório onde não se erguesse nenhuma estátua visível à distância; desconhecidas as encostas que nenhum pastor tivesse explorado, não mereciam que se lhes consagrasse uma única palavra. Eram apenas cenas vazias enquanto o homem não aparecesse, animando este cenário com a ação serena ou trágica de seu corpo. Tudo o esperava, e lá onde ele aparecia, tudo se apagava para lhe dar lugar.
      A arte cristã negligenciou estar relação com o corpo, sem por isso se aproximar verdadeiramente da paisagem; homens e coisas eram como caracteres dos quais ela dispunha, formando longas frases, cuidadosamente pintadas com um alfabeto de iniciais. Os homens eram roupas, e somente no inferno eram corpos; a paisagem raramente era a terra. Em quase toda pintura onde a paisagem era agradável ela precisava estar representando o céu e nas que fosse selvagem e inóspita, despertava o terror, era o lugar dos exilados, eternamente perdidos. Começava-se a ver a paisagem; porque os homens haviam se tornado finos e transparentes, mas eles eram feitos de tal modo que deveriam sentir a paisagem como uma duração efêmera, como túmulos enfileirados invadidos pelo verdor, sob os quais estava suspenso o inferno e sobre os quais se abria o grande céu como a verdadeira realidade, profunda e desejada por tudo o que é. Agora que, de repente, havia três lugares, três moradas sobre as quais havia muito a falar: céu, terra e inferno; tornava-se indispensável uma determinação dos lugares, era preciso olha-los e até mesmo representa-los. Nos Mestres primitivos italianos, esta representação, ultrapassando o próprio objeto, atingiu uma grande perfeição, basta lembrar as pinturas de Campo Santo em Pisa para sentir que a concepção da paisagem já havia atingido uma certa autonomia. Certamente acreditava-se designar um lugar e nada mais, mas isso era feito com tal calor e com um tal abandono, falava-se com uma eloqüência tão atraente e com tanto amor às coisas que eram ligadas à terra, a esta terra suspeita e renegada pelos homens, que esta pintura hoje nos aparece como um hino a esta terra, entoado pelos santos. E todas as coisas que se via eram novas, de modo que esta contemplação era acompanhada por um espanto perpetuo, por uma alegria provocada por inúmeras descobertas. E consequentemente, ao mesmo tempo que a terra, celebrava-se o céu que se aprendia a conhecer porque se tinha saudades de seu conhecimento. Porque a piedade profunda é como uma chuva: acaba sempre recaindo sobre a terra de onde se elevou e é uma benção para os campos.
      Sem querer, tinham sentido o calor, a felicidade e o esplendor que podem irradiar de um prado, de uma vertente florida e de árvores carregadas de frutos que se erguem umas ao lado das outras; de tal modo que quando se pintavam madonas, esta riqueza cercava-as como se fosse um casaco, coroava-as como se fosse uma coroa e a abriam-se paisagens, como bandeiras, em sua honra; porque não se sabia preparar-lhes nenhuma festa mais animada, não se conhecia nenhum dom que igualasse a este: apresentar-lhes todas as belezas que acabavam de ser descobertas e fundi-las com a madonas. Não se designava mais nenhum lugar específico, nem o céu: entoava-se a paisagem como um hino a Maria, que explodia em cores vivas e claras.
      Mas, fazendo isso, dera-se um grande passo. Pintava-se a paisagem sem se pensar precisamente nela, tendo em vista sobretudo a si mesmo; ela tornara-se pretexto para a expressão de um sentimento humano, a parábola de uma alegria, de uma simplicidade e de uma piedade humanas. Tornara-se arte. E Leonardo já a concebera assim. As paisagens em seus quadros são imagens da sua experiência e de seu saber os mais secretos, espelhos azuis onde leis misteriosas contemplam-se pensativamente, fundos grandes como futuros e enigmas não resolvidos. Não é por acaso que Leonardo, que começou a pintar homens como experiências, como destinos que ele havia atravessado solitariamente, sentiu também a paisagem como meio de expressão de uma experiência, de uma profundidade e de uma tristeza quase indizíveis. A este homem que antecipava tantas conquistas ainda irrealizáveis foi dado usar todas as artes com uma infinita grandeza; ele falava através delas como em línguas múltiplas, de sua vida e de progressos e profundidades de sua vida. Ninguém pintou ainda uma paisagem que seja tão completamente paisagem e que seja, no entanto, confissão e voz pessoal como esta profundidade que se abre atrás da Mona Lisa. Como se tudo que é humano estivesse contido na sua imagem infinitamente silenciosa e como se todo o resto, tudo que está diante do homem e tudo que o ultrapassa, estivesse contido nesta relação misteriosa de montanhas, arvores, pontes, céus e água. Esta paisagem não é a imagem de uma impressão, não é a opinião de um homem sobre coisas imóveis; ela é natureza em devir, mundo em gestação, tão estrangeira ao homem quanto uma floresta desconhecida numa ilha deserta. E era preciso olhar a paisagem como uma coisa longínqua e estrangeira, como uma coisa perdida e sem amor, que se realiza por inteira em si mesma, para que, um dia, ela pudesse servir de meio e de ponto de partida para uma arte autônoma. Era preciso que ela fosse distante e muito diferente de nós para que pudesse tornar-se uma parábola libertadora para o nosso destino. Era preciso que na sua indiferença sublime se mostrasse quase hostil para poder oferecer à nossa existência uma nova interpretação graças a seus objetos. Foi com este espírito que tomou forma esta arte da paisagem da qual Leonardo da Vinci já tivera o pressentimento e o domínio. Ela se desenvolveu lentamente, entre as mãos de solitários, de século em século. Longa era a estrada que precisava ser trilhada porque era difícil se desacostumar do mundo de maneira tão completa que fosse permitido vê-lo sem o olho prevenido do indígena que relaciona tudo com ele mesmo e com suas necessidades quando olha. Sabemos quão mal vemos as coisas no meio das quais vivemos; geralmente é preciso que alguém venha para nos dizer o que nos cerca; foi necessário então começar por afastar as coisas de si para tornar-se capaz, em seguida, de aproximar-se delas de modo mais imparcial e mais sereno, com menos familiaridade e com um recuo respeitador, porque só no instante se começava a compreendê-la; quando sentia-se que ela era outra coisa, esta realidade que não toma parte, que não tem sentidos para nos perceber, só então se saía dela, solitário, fora de um mundo deserto. 
      E isso era preciso para que o artista se tornasse artista por ela; não se devia mais senti-la enquanto sujeito, na significação que ela tinha para nós, mas como objeto, como uma grande realidade que estava aí.
      Foi assim que se experimentou o homem no tempo em que pintavam-no grande; mas o homem se tornou oscilante e incerto e sua imagem tornava-se fluida, quase inapreensível. A natureza era mais durável e maior; todos os movimentos nela eram mais largos, todo repouso mais simples e cercado de solidão. Havia no homem uma saudade de falar de si através destes meios sublimes, como de uma realidade não menos forte, e foi assim que nasceram as paisagens onde nada acontece. Mares desertos foram pintados, casas brancas em dias chuvoso, estrada nas quais ninguém caminha e extensões de água de uma indizível solidão. O pathos se dissipava cada vez mais, e quanto mais se dominava esta língua, mais simplesmente ela era utilizada. Afundava-se na grande calma das coisas, sentia-se sua existência tomar a forma de leis, sem espera e sem impaciência. E os animais iam e vinham por entre elas, calmos, suportando como elas o dia e a noite, obedecendo às mesmas leis. E quando o homem, mais tarde, entrou nesse ambiente, como pastor, camponês, ou simplesmente figura no fundo do quadro, ele havia perdido toda presunção e via-se que ele não queria ser nada além de uma coisa.
      Este desenvolvimento da arte da paisagem, esta lenta transformação do mundo em paisagem corresponde a uma longa evolução do homem. O conteúdo destas imagens, que emanava, de modo absolutamente involuntário, da contemplação e do trabalho, nos ensina que um futuro começou no coração de nosso tempo; que o homem não é mais o ser sociável que se move em equilíbrio por entre seus semelhantes, nem aquele em torno do qual gravitam a noite e a manhã, o próximo e o distante. Que ele está entre as coisas como uma coisa, infinitamente só, e que toda comunhão de coisas e homens se retirou para a profundidade comum onde se nutrem as raízes de tudo o que cresce.  






from: Roberta Ferraz
to: Erica, Re Huber
date: Tue, Oct 20, 2009 at 7:52 PM
subject: RE: marinheiras, texto boa noite




gracias eriqueta






e para dar boa noite, uma das coisas mais fabulosas que li nesta vida, neste hoje:






"


à lareira, cansados, não da obra


mas porque a hora é a hora dos cansaços,


não puxemos a voz


acima de um segredo


"






















tudo isso, só isso






boa noite marujas






hasta


from: erica zingano
to: Roberta Ferraz, Re Huber
date: Tue, Oct 20, 2009 at 8:00 PM
subject: Re: marinheiras, texto boa noite






ah gente


segue a foto das colunatas do tejo
pórtico para o infinito
de que falamos hoje


beijos




ez








from: Roberta Ferraz
to: Erica, Re Huber
date: Tue, Oct 20, 2009 at 8:08 PM
subject: RE: marinheiras, texto boa noite




yesyesyes






já temos nosso cenário






podemos altear bandeira e fogo nas águardentes


em que navegamos


na noite dos encargos














amo


from: Renata Huber
to: Roberta Ferraz, Erica
date: Wed, Oct 21, 2009 at 12:09 AM
subject: Re: marinheiras, texto boa noite




queridas marujas marinheiras sereias






navegar o barco incógnito


dos nossos sonhos a teatro


uplahô !






animadíssima






vibrando junto






as brisas


os sopros


as presenças todas






thanks rô, ez,


pelo rilke, ricardo


llansol, baudelaire


a foto inspiradora


ahhhh






a leitura compartilhada abre sentidos, horizontes, profundidades...






beijo beijo





from: Renata Huber
to: erica zingano, Roberta Ferraz
date: Wed, Oct 21, 2009 at 12:59 AM
subject: vegetaçõesmarinhas




segue trechos de "Nos penhascos de mármore", de Ernst Jünger.


Não encontrei o trecho exato, que se bem me lembro, descreve a floresta caos, o éden da barbárie e por aí vai. Mas acho que esse dialoga...






"Quando estamos felizes, as mais modestas dádivas deste mundo satisfazem os nossos sentidos. Desde sempre eu venerei o reino vegetal e, em muitos anos de peregrinação, investiguei os seus prodígios. Era-me familiar o momento em que o coração palpita, ao se pressentirem os segredos que cada grão de semente abriga em seu desenvolvimento. Contudo, o esplendor do crescimento nunca me fora tão próximo quanto o era nesse chão que exalava um cheiro de verde há muito fenecido.


Antes de me deitar eu perambulava um instante no estreito corredor central. Naquelas meias-noites eu pensava amiúde que jamais observara as plantas tão reluzentes e admiráveis. Sentia de longe o aroma dos vales espinhosos e constelados de brancura, que na primavera eu fruíra na Arabia Deserta, e o cheiro de baunilha que refresca o caminhante no calor sem sombras dos bosques de araucárias. Então, como páginas de um velho livro, emergiam novamente as lembranças de certas horas de indescritível abundância - de pântanos quentes nos quais a vitória-régia e de vegetações marinhas que de longe se vêem arder, ao meio-dia, sobre suas pálidas pernas-de-pau, defronte a costas de palmeiras. Faltava-me, porém, o medo que nos assalta sempre que vislumbramos o crescimento demasiado, o qual, de modo semelhante à imagem divina, com mil braços nos atrai. Eu sentia como, por meio de nossos estudos, novas forças despontavam para resistir aos ardentes poderes anímicos e domá-los, assim como os cavalos são conduzidos pela rédea.


Amanhecia, muitas vezes, antes que eu me estirasse sobre o catre de campanha que tinha sido armado no herbário. (pg 35,36)






.....






"Logo a abertura se apresentava larga como o portão de um celeiro. Acendemos as tochas e adentramos a floresta como se imergíssemos numa garganta escura" (pg 141)






from: Roberta Ferraz
to: Erica, Re Huber
date: Wed, Oct 21, 2009 at 10:01 AM
subject: cavalo da noite




antes mesmo de ler seus escritos de ontem, companheiras


levanto-me de roupão recém saída do sonho


e venho vos contar isso:






não me lembro muito bem, há sempre nuvem nisso


mas eu conversava, julgo que com o gilbert durand


ou não, era um homem mais velho...


eu dizia a ele que meu projeto de mestrado - sim,


era ela, agora lembro - havia nascido de ler seu livro


- o exato texto que separei para lermos hoje -


e ele me perguntou: 'e o cavalo que você viu


vinha de manhã ou de noite?'


e eu fechava os olhos para me lembrar, e disse:


'eu li teu livro à noite, era um cavalo da noite'


e ele: 'ahhhhh, pois bem, porque sendo o cavalo


da manhã o cavaleiro bem podia ser 'robert graves',


mas o cavalo da noite é guiado pelo próprio


conquistador, por ele mesmo'.










algo mais de névoa entoou


e eu me senti como uma égua de fogo


um fogo-fátuo aterrorizador, belo






que coisa!


e agora acordada, nesta outra realidade


(ainda durmo?) olho minha estante de livros


e o livro do robert graves está em minha frente:


'a deusa branca'. e esse nome? robert - roberta


graves - túmulos?


minha morte again and again vindo falar comigo?


influência de ter me despedido da vigília, ontem, com o Reis?






e o cavaleiro da noite? o conquistador?


d. sebastião, é isso? é novamente ele


- o sete estrelo - me empunhando ao texto?


por que mistério, eu pergunto? e esta entrega,


sou eu que ofereço?






vejo vcs no cair do dia










amo






rosa

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